Entrevista concedia ao Portal Dol
Jornalista é condenado por ter contado a
verdade
No sofá e na mesa de sala, abarrotados de
livros, jornais e algumas revistas, alguns livros se destacam. São os que
versam sobre códigos penais ou os que esmiuçam filigranas jurídicas. É neles
que o jornalista Lúcio Flávio Pinto recorre para entender um pouco mais como um
processo que envolve um reconhecido – pela própria Justiça- grileiro de terras
e um jornalista que não mentiu e nem se utilizou de falsas informações tende a
pender favoravelmente ao primeiro e não ao segundo.
No último dia 7 o presidente do Superior
Tribunal de Justiça, ministro Ari Pargendler, decidiu negar seguimento ao
recurso especial interposto por Lúcio Flavio contra decisão da justiça paraense
que havia condenado o jornalista a indenizar o empresário Cecílio do Rego
Almeida por dano moral.
É uma história que já remonta há duas
décadas. Cecílio Rego de Almeida (já morto), dono da Construtora C. R. Almeida,
uma das maiores empreiteiras do país, entrou com um processo contra Lúcio
Flávio Pinto porque o jornalista o havia chamado, em uma edição do Jornal
Pessoal, de “pirata fundiário”. O termo pode ser forte ou irônico, mas a
realidade é que a empresa havia se apossado de uma área de quase cinco milhões
de hectares no vale do rio Xingu, no Pará, muitas em áreas de assentamento ou
reserva legal. É tão real a grilagem que a justiça federal de 1ª instância
anulou os registros imobiliários dessas terras, por pertencerem ao patrimônio
público. Fez mais: demitiu por justa causa todos os funcionários do cartório de
Altamira envolvidos na fraude.
A partir daí o jornalista se viu envolvido
numa história digna de Franz Kafka, o escritor tcheco que escreveu ‘O
Processo’, um romance que conta a história de Josef K., personagem que acorda
certa manhã, e, sem motivos conhecidos, é preso e sujeito a longo e
incompreensível processo por um crime não revelado. É daí que vem a expressão
kafkiana, sempre que se refere a um processo incompreensível.
“Recebi sentenças ilegais como a de um juiz
que, substituindo a titular por alguns dias, levou o processo de 400 páginas
para casa durante o fim de semana, devolveu na terça-feira, quando a juíza
titular já estava no domínio das funções e sentenciou retroativamente para a
sexta-feira, entre 10h e 14h”, lembra Lúcio Flavio Pinto.
Nessas idas e vindas judiciais, o processo
chegou a sumir. “Esgotei todas as ferramentas jurídicas possíveis. Tudo foi
rejeitado. Agravos, mandados, tudo”, diz Lúcio Flavio. Para ele, decisões mais
políticas do que propriamente jurídicas. “Eu critico os erros do judiciário
paraense no meu Jornal Pessoal”, avalia.
DERROTA
A última derrota judicial foi quando o
presidente do STJ não recebeu o recurso de Lúcio Flávio por alguns pequenos
erros cometidos pelo jornalista e por quem o defende. “Em razão da deficiente
formação do instrumento; falta cópia do inteiro teor do acórdão recorrido, do
inteiro teor do acórdão proferido nos embargos de declaração e do comprovante
de pagamento das custas do recurso especial e do porte de remessa e retorno dos
autos. Ou seja: o agravo de instrumento não foi recebido na instância superior
por falhas formais na juntada dos documentos que teriam que acompanhar o
recurso especial”, escreveu Lúcio em uma nota divulgada à sociedade.
O despacho foi publicado no Diário Oficial
eletrônico do STJ no dia 13. “A partir daí eu teria prazo de 15 dias para
entrar com um recurso contra o ato do ministro. Ou então através de uma ação
rescisória. O artigo 458 do Código de Processo Civil a prevê”, diz o
jornalista. Se tomasse essa decisão, Lúcio Flavio poderia adiar por mais alguns
anos o julgamento final do processo, já que ele seria reapreciado.
Lúcio Flavio preferiu outro caminho.
Decidiu não recorrer mais e expor à sociedade o que entende ser uma perseguição
política. Com apoio do irmão Pedro Carlos de Faria Pinto, foi aberta uma conta
no Banco do Brasil, para que a sociedade possa ajudar a pagar a indenização,
que, originalmente era de R$ 8 mil, mas que corrigida e acrescentada por outros
penduricalhos legais, deve ultrapassar R$ 20 mil. “Quando eu for pagar, quero
que fique claro que é o povo, o mesmo que sempre foi espoliado por um cidadão que
se apossou de terras de forma ilegal, quem está pagando essa aberração”, diz
Lúcio Flávio. “Espero que esse gesto estimule os bons juízes, que são a
maioria, para que corrijam esses erros e punam os maus juízes”, complementou.
(Diário do Pará)
Nenhum comentário:
Postar um comentário